O FOGO QUE NUNCA SE APAGAVA

14/03/2016 12:43:48
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Publicada em 14/03/2016

Na minha infância, era para mim – e acho que para as demais crianças- motivo de admiração e de espanto, uma chama que nunca se apagava, crepitando a qualquer hora do dia e da noite. O palácio sagrado que abrigava tal fogo misterioso, visto pela janela, de um de seus muitos cômodos, ficava no, então, longínquo bairro de Duas Pedras.

Era a Fábrica de Carbureto, nome popular da Companhia Industrial Friburguense, constituída em 22 de abril de 1924, situada na Rua Prudente de Moraes, 188, cujo fundo do terreno era a margem do Rio Bengalas (naquele tempo não havia a Av. Costa e Silva e, hoje, ali se encontra a Agência Frivel). Tal indústria tinha por finalidade a exploração e manufatura de produtos eletrotérmicos e eletroquímicos em geral.

O Carbeto de Cálcio ou Carbureto de Cálcio -o popular Carbureto- era empregado em lampiões domésticos, em lanternas em geral e, até, nas antigas lanternas de bicicletas. A partir do Carbureto é obtido o Gás Acetileno usado em soldas, cortes de metais por maçarico, na fabricação de objetos de vidro e na produção de borracha sintética.

Com o desenvolvimento da empresa, em 1941, ela passa a se denominar Companhia Industrial Friburguense de Produtos Químicos, aumentando o seu capital para mil contos de réis. Seu principal acionista era o empresário da construção naval, o engenheiro Henrique Lage que, por longo tempo, ocupou o cargo de Presidente da Companhia, residindo com sua esposa, a cantora lírica italiana Gabriella Besanzoni, num palacete no Parque Lage, no bairro do Jardim Botânico, no Rio.

Ele era o proprietário de um importante estaleiro, na Ilha do Viana, que utilizava o Carbureto processado na Cia. Industrial Friburguense para a sua iluminação. Segundo o historiador Carlos Wehrs, autor de “NITERÓI, ontem e anteontem”, o avô de Henrique Lage, o Sr. Antônio Martins Lage adquiriu a referida ilha, por volta de 1840 (após a morte trágica do antigo proprietário, o Conde de Gestas) numa rifa, cujo bilhete custou dez mil reis, sendo ele o premiado.

Um ano após a morte de Henrique Lage , pelo Decreto-Lei nº 4648 de 2-9-1942, a Cia. Industrial Friburguense de Produtos Químicos e mais 28 empresas, da chamada “Organização Lage, foram incorporadas ao patrimônio nacional. Dentre elas: a Cia. Nacional de Navegação Costeira, o Lloyd Nacional S.A., a Cia. Nacional de Mineração de Carvão, a Sociedade Brasileira de Cabotagem, a S.A. Gás de Niterói, a Refinaria de Sal ITA (a primeira do Brasil), etc.

À Companhia Industrial Friburguense de Produtos Químicos, pelo Decreto-Lei nº 36534 de 3-12-1954, assinado pelo Presidente Café Filho, foi outorgada a concessão para o aproveitamento de energia hidráulica das corredeiras existentes no Rio Grande, em Riograndina.

No final dos anos 50, início de 60, a misteriosa e popular Fábrica de Carbureto chegava ao fim. Apagava-se, assim, o fogo que a criançada julgava ser eterno. No seu lugar, já em 1964, funcionava com muito sucesso, a USABRA- Indústria e Comércio S.A. – especializada em fabricar o que havia de mais moderno, na época, móveis de fórmica. Tudo era revestido de fórmica: móveis de sala, de copa, de cozinha, de quarto. O nome Usabra era um orgulho para os friburguenses, reconhecido em todo o Brasil, levando a crer que funcionaria, por inúmeras décadas, mas encerrou suas atividades, no final década de 1970.

Hoje, só resta parte do imponente imóvel que abrigou, outrora, indústrias tão importantes.

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