Filmes da semana 22/06 até 28/06

23/06/2018 12:18:11
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Estreia esta semana em Nova Friburgo Canastra Suja. O diretor e roteirista Caio Sóh construiu um drama de forma autoral que busca uma fluidez teatral em um crescente catártico, explorando os lados de ternura e loucura de uma família disfuncional. Adriana Esteves e Marco Ricca, que viveram juntos na vida real por 10 anos, formam um casal com três filhos, em um núcleo familiar cheio de conflitos pessoais e relacionais. Diferente das Tragédias Cariocas de Nelson Rodrigues, Sóh não somente busca criticar a sociedade e dar tapas no conservadorismo hipócrita, ele faz um jogo psicológico que trabalha o destrutivo, a desconstrução. A proposta foi a de traduzir um cinema mais naturalista, buscando um recorte visceral. A luz é amarelada, angustiante, e o som tenta traduzir o cenário e os demais aspectos visuais. Na verdade, o trabalho de captação de som buscou uma tridimensionalidade, algo raro no cinema, o que possibilita aos deficientes visuais mais compreensão da composição cênica. As cenas, muitas vezes feitas em plano sequencia, se traduzem em muita fluidez quanto a dinâmica dos atores, como se estivéssemos lá, lamentando o peso dramático. O ponto forte do filme, está no irretocável trabalho dos atores. Ninguém teve moleza, todas as personas são complexas e funcionam como catracas em uma engrenagem. São certamente os melhores trabalhos de Adriana Estevas, Marco Ricca, Bianca Bin, Pedro Nercessian e Cacá Ottoni. O filme, porém, se divide em duas partes. A primeira é a melhor, pois consegue fazer as apresentações, mostrar os conflitos e compor certa ternura e cumplicidade. A segunda é basicamente caos. Esse foi um caminho seguido por Caio Sóh que pode desagradar a muitos, mas tem uma construção lógica. O fato é que cinema se faz assim e esse, é um ótimo representante do bom cinema nacional. Vale muito o ingresso e a indicação etária é para maiores de 16 anos. 

A outra estreia desta semana é Hereditário. Aparentemente parecia ser mais um filme de terror com clichês, sustos gratuitos e música exagerada. Ari Aster escreveu e dirigiu uma obra e conseguiu provar ser possível fazer algo novo, forte, inteligente e assustador, mesmo no tão desgastado gênero do terror. Importante dizer que pode não agradar a todos, principalmente por exigir uma construção interpretativa. Nada é muito dado e podemos sair do cinema com mais de uma possibilidade do que aconteceu. O filme não recorre a monstros para assustar, não mostra agonia de pessoas morrendo ou se agarra ao sobrenatural. Ele trabalha a racionalidade e a loucura através de expressões e sonhos que revelam mais do que a própria realidade. O enredo é sobre uma família que possui um histórico de problemas mentais e, após a morte da matriarca, coisas estranhas se revelam, os conflitos se intensificam e nada mais parece estar sobe controle. O trabalho de referências dentro da própria obra é grandioso. Destaque para casa de brinquedo que logo no início já nos desafia a entender o jogo de camadas, como se tudo não passasse de uma manipulação, como todos fizessem parte de um tabuleiro. Outro ponto que chama muito a atenção é a trilha sonora (Score). Confesso que nunca tinha visto nada assim em filmes de terror. Os temas são contemplativos, nada tensos e consonantes. Os atores também merecem destaque. Toni Collette interpreta a mãe que desmorona e  encontra explicação no insano e paranormal, Gabriel Byrne faz o marido racional, um mediador, Milly Shapiro é a filha com problemas mentais e Alex Wolff é o filho rejeitado que se transforma em uma peça central. Aclamado no festival de Sundance, Hereditário vai se posicionar como um dos grandes do terror e prova que sempre é possível sair da caixa, e que o caminho natural é experimentar e ousar. Lembro ao leitor que o filme pode não agradar a todos. Não por deixar em aberto as questões, como muitos podem entender, na verdade, ele vai além e abre as possibilidades e com o acesso de obras audiovisuais tão chatas e amarradinhas, pode causar alguma estranheza. Vale muito o ingresso e a indicação etária é para maiores de 16 anos.

Por fim, mesmo não sendo uma estreia, afinal está em cartaz em Nova Friburgo faz uma semana por conta do festival Varilux de cinema francês, é importante falar sobre o ótimo O Amante Duplo, que ficou mesmo após o término do festival. François Ozon é um cineasta experiente e celebrado pela profundidade com que aborda temas e o olhar purista, metafórico e provocador. É um dos cineastas franceses que conseguem freqüentemente romper a barreira geográfica e ter seus filmes em cartaz em todo mundo e isso, não é por acaso. O Amante Duplo é um drama erótico que explora a psique humana e a sexualidade. Não vejo como abordar o enredo sem spoiler. Trata-se de uma sequencia de descobertas e dilemas que a bela Chloé, interpretada por Marine Vacth, vai enfrentar, em contraste com sua vida e trabalho de observadora em um museu de arte. Além da força e intensidade das personas, Ozon faz uma “brincadeira” com as obras de arte. Destaque para a árvore que nasce das colunas e se ramifica por todo o ambiente como um rompimento, uma ascensão, enquanto Chloe, em primeiro plano, está prestes a descobrir seu próximo e maior desafio. Outro ponto que chama a atenção são as boas sequências montadas entre elementos. São formas narrativas pouco ou mal usadas em geral, mas que introduzem elementos narrativos inteligentes e metafóricos. Esse é o bom cinema francês e uma ótima oportunidade que temos aqui em Nova Friburgo de desfrutar de uma obra mais sofisticada, autoral, impactante. Vale muito o ingresso e a indicação etária é para maiores de 18 anos.

Sugestão:
Para assistir em casa a dica desta semana vai para Maldito Futebol Clube. Certamente um dos melhores filmes sobre futebol de todos os tempos. Ele aborda a trajetória de Brian Clough como treinador que durou apenas 44 dias no cargo, mas que causou muita polêmica. É uma narrativa não linear e com cenas impressionantes em campo. Em tempo de Copa do Mundo, vale conhecer um pouco mais sobre a história e personagens do futebol.

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